Imposto Seletivo: alíquotas específicas e ad valorem
O avanço da Reforma Tributária, especialmente por meio da Emenda Constitucional nº 132/2023, trouxe à tona a criação do Imposto Seletivo (IS), um novo tributo com vocação extrafiscal, que visa desincentivar o consumo de bens e serviços considerados prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente. Dentre os inúmeros debates suscitados por essa inovação constitucional, destacam-se os critérios para a definição das alíquotas aplicáveis, notadamente a escolha entre alíquotas específicas ou ad valorem.
Embora a Constituição Federal tenha determinado que o Imposto Seletivo será instituído por lei complementar, a definição prévia de sua estrutura, finalidades e forma de incidência já se tornou essencial para que as empresas brasileiras possam antecipar seus impactos econômicos, operacionais e jurídicos. Este artigo explora com profundidade o conceito e os efeitos práticos da aplicação de alíquotas específicas e ad valorem no contexto do Imposto Seletivo.
O que é o Imposto Seletivo?
Quem acompanhou os últimos textos já deve saber que o Imposto Seletivo foi inserido na Constituição como um tributo com função extrafiscal, ou seja, seu principal objetivo não é arrecadatório, mas sim regulatório. Previsto no artigo 153, inciso VIII da Constituição (na redação conferida pela EC 132/2023), o IS incidirá sobre a produção, comercialização ou importação de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente, como, por exemplo, cigarros, bebidas alcoólicas, bebidas açucaradas, combustíveis fósseis, entre outros.
A competência para instituí-lo é da União, e sua arrecadação não poderá ser compartilhada com os demais entes federativos, uma característica que reforça sua natureza regulatória e centralizada. Ainda, a norma constitucional determina que o IS não poderá incidir sobre bens e serviços sujeitos ao ICMS e ao ISS, o que limita seu escopo àqueles fora do novo modelo de Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS).
Alíquotas ad valorem e específicas: conceitos fundamentais
A definição da forma de cobrança do Imposto Seletivo é um dos elementos centrais de sua regulamentação e merece atenção especial. De maneira geral, os tributos podem ser cobrados com base em alíquotas ad valorem ou alíquotas específicas, cada uma com características próprias:
- Alíquota ad valorem: é expressa em percentual sobre o valor do bem ou serviço. Por exemplo, uma alíquota de 25% sobre um produto de R$ 100 resulta em uma incidência de R$ 25 de imposto. Essa forma de tributação acompanha o preço de mercado do item e tende a ser mais sensível à variação dos valores praticados.
- Alíquota específica: é fixada em valor absoluto por unidade de medida do bem ou serviço (litro, quilo, unidade etc.). Por exemplo, R$ 1 por litro de bebida alcoólica, independentemente de seu valor de mercado. Essa modalidade foca na quantidade consumida, e não no valor econômico da operação.
Ambas as formas têm vantagens e desvantagens. No contexto do Imposto Seletivo, a escolha entre elas terá reflexos diretos sobre a carga tributária, o comportamento dos consumidores e a previsibilidade para as empresas.
Implicações econômicas e jurídicas das alíquotas ad valorem
A aplicação de alíquotas ad valorem tende a ser mais proporcional ao valor do bem ou serviço, o que pode parecer mais justo sob a ótica distributiva. Contudo, essa modalidade pode favorecer a comercialização de produtos mais baratos e de pior qualidade, justamente os que a política extrafiscal do IS busca desestimular.
Além disso, a tributação ad valorem é mais volátil, pois acompanha as oscilações de preço do mercado. Isso pode comprometer a previsibilidade arrecadatória do Estado e dificultar o planejamento empresarial, especialmente em setores com forte variação cambial ou sazonal.
Do ponto de vista jurídico, a alíquota ad valorem exige atenção à base de cálculo, que deve ser clara e estável para evitar conflitos interpretativos. A ausência de critérios objetivos pode dar margem a discussões judiciais sobre composição de preço, descontos, frete e outras parcelas integrantes da base de cálculo.
As vantagens e desafios das alíquotas específicas
Por sua vez, as alíquotas específicas garantem maior previsibilidade e simplicidade na cobrança, pois são baseadas na quantidade e não no valor da transação. Isso torna mais fácil a fiscalização e o controle do tributo, sobretudo em setores com histórico de informalidade.
No entanto, essa modalidade pode gerar distorções econômicas, como a penalização de produtos de menor valor agregado. Por exemplo, a cobrança de um valor fixo por litro de bebida alcoólica pode onerar de maneira desproporcional as versões mais baratas, atingindo principalmente consumidores de menor renda, o que levanta questionamentos sobre equidade.
Ainda, as alíquotas específicas exigem atualizações periódicas, pois tendem a perder valor real com o tempo devido à inflação. Isso pode tornar o tributo ineficaz se não houver mecanismos automáticos de correção monetária, o que depende de previsão legal expressa e clara.
A possível adoção de um modelo híbrido
Diante das características e limitações de cada modalidade, muitos especialistas defendem a adoção de um modelo híbrido, combinando alíquotas ad valorem e específicas conforme a natureza do bem ou serviço.
Essa abordagem permitiria, por exemplo, a tributação de bebidas açucaradas com alíquota específica (por litro), reforçando o desestímulo ao consumo em volume, e ao mesmo tempo com alíquota ad valorem, assegurando proporcionalidade conforme o valor do produto.
A escolha do modelo, contudo, precisa ser feita de forma técnica, transparente e baseada em evidências, levando em consideração os efeitos sobre o mercado, o consumidor e os objetivos extrafiscais pretendidos. A ausência de estudos aprofundados pode comprometer a eficácia do imposto e gerar insegurança jurídica para as empresas.
Perspectivas regulatórias e desafios para as empresas
A regulamentação do Imposto Seletivo por lei complementar deverá definir, com clareza, quais setores serão atingidos, quais produtos estarão sujeitos à incidência, e quais serão os critérios de definição das alíquotas. Nesse cenário, as empresas precisam se preparar desde já, promovendo mapeamentos internos, revisões de precificação, simulações de impacto e planejamento tributário.
Além disso, é recomendável acompanhar ativamente os debates legislativos e os atos normativos que definirão a operacionalização do imposto, bem como buscar assessoria jurídica especializada, sobretudo em setores com alta sensibilidade regulatória.
Conclusão
O Imposto Seletivo inaugura um novo capítulo na tributação brasileira, com foco em desincentivar comportamentos de consumo considerados prejudiciais ao interesse público. A definição entre alíquotas específicas e ad valorem será decisiva para a eficácia da política pública, a viabilidade econômica das empresas e a justiça tributária.
Neste momento de transição, contar com orientação especializada é essencial para antecipar riscos, identificar oportunidades e garantir conformidade com as futuras normas.
Se a sua empresa atua em segmentos que podem ser afetados pelo novo Imposto Seletivo, entre em contato com nossa equipe. Estamos prontos para auxiliá-lo a entender o novo cenário tributário e desenvolver estratégias eficazes para enfrentá-lo com segurança e inteligência.
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